Get me outta here!

sábado, 28 de fevereiro de 2015

LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - MINHAS FÉRIAS

Minhas Férias
Luís Fernando Veríssimo

Eu, minha mãe, meu pai, minha irmã (Su) e meu cachorro (Dogman) fomos fazer camping. Meu pai decidiu fazer camping este ano porque disse que estava na hora de a gente conhecer a natureza de perto, já que eu, a minha irmã (Su) e o meu cachorro (Dogman) nascemos em apartamento, e, até cinco anos de idade, sempre que via um passarinho numa árvore, eu gritava “aquele fugiu!” e corria para avisar um guarda; mas eu acho que meu pai decidiu fazer camping depois que viu os preços dos hotéis, apesar da minha mãe avisar que, na primeira vez que aparecesse uma cobra, ela voltaria para casa correndo, e minha irmã (Su) insistir em levar o toca-disco e toda a coleção de discos dela, mesmo o meu pai dizendo que aonde nós íamos não teria corrente elétrica, o que deixou minha irmã (Su) muito irritada, porque, se não tinha corrente elétrica, como ela ia usar o secador de cabelo?
Mas eu e o meu cachorro (Dogman) gostamos porque o meu pai disse que nós íamos pescar, e cozinhar nós mesmos o peixe pescado no fogo, e comer o peixe com as mãos, e se há uma coisa que eu gosto é confusão. Foi muito engraçado o dia em que minha mãe abriu a porta do carro bem devagar, espiando embaixo do banco com cuidado e perguntando “será que não tem cobra?”, e o meu pai perdeu a paciência e disse “entra no carro e vamos embora”, porque nós ainda nem tínhamos saído da garagem do edifício.
 Na estrada tinha tanto buraco que o carro quase quebrou, e nós atrasamos, e quando chegamos ao lugar do camping já era noite, e o meu pai disse “este parece ser um bom lugar, com bastante grama e perto da água”, e decidimos deixar para armar a barraca no dia seguinte e dormir dentro do carro mesmo; só que não conseguimos dormir, porque o meu cachorro (Dogman) passou a noite inteira querendo sair do carro, mas a minha mãe não deixava abrirem a porta, com o medo de cobra; e no dia seguinte tinha a cara feia de um homem nos espiando pela janela, porque nós tínhamos estacionado o carro no quintal da casa dele, e a água que o meu pai viu era a piscina dele e tivemos que sair correndo.
No fim conseguimos um bom lugar para armar a barraca, perto de um rio. Levamos dois dias para armar a barraca, porque a minha mãe tinha usado o manual de instruções para limpar umas porcarias que meu cachorro (Dogman) fez dentro do carro, mas ficou bem legal, mesmo que o zíper da porta não funcionasse e para entrar ou sair da barraca a gente tivesse que desmanchar tudo e depois armar de novo.
O rio tinha um cheiro ruim, e o primeiro peixe que nós pescamos já saiu da água cozinhando, mas não deu para comer, e o melhor de tudo é que choveu muito, e a água do rio subiu, e nós voltamos pra casa flutuando, o que foi muito melhor que voltar pela estrada esburacada; quer dizer que no fim tudo deu certo.


Veríssimo, Luis Fernando. O Santinho. Rio de Janeiro. Objetiva

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

ANÔNIMO - O SAPATEIRO

O Sapateiro

anônimo


    Era uma vez, há muitos anos, um pobre sapateiro que tinha muitos filhos. Mas, no meio da sua pobreza, era alegre e feliz. Enquanto remendava os sapatos, ou lhe punha as meias-solas, ia cantarolando.
    Naquela casa parece que era festa todos os dias. A sua esposa e os filhos sentiam-se muito felizes
   Um dia um, vizinho rico, impressionado com a vida desse pobre sapateiro, pôs-lhe uma bolsa de dinheiro à porta.
  Quando se fez noite, o pobre e a esposa puseram-se a contar todo esse dinheiro oferecido. Mas as contas não davam certas. Ele dizia uns números e a mulher outros. Os filhos foram postos de parte, porque lhes disseram que não eram chamados para o assunto.
  O tom de voz começou a ouvir-se mais alto e o ambiente familiar ficou perturbado.
 O bom sapateiro, poucos dias depois, reflectiu e ponderou a situação. Acabou por concluir que era melhor ser pobre, mas feliz e dar felicidade ao seu lar. Então, entregou a bolsa do dinheiro à esposa dizendo-lhe:
 - Devolve-o ao rico e diz-lhe que preferimos ser pobres, mas continuar a ser felizes e a semear felicidade.
 Não somos pela pobreza sociológica e desejamos para toda a gente uma vida digna. Mas somos a favor de um estilo de vida sóbria, sem o exagero de buscar nas riquezas a felicidade. Não será , que esta também se encontra na partilha de bens?
fim

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

ANÔNIMO - O MURO DE ASGARD - CONTOS NÓRDICOS

O Muro de Asgard
Contos Nórdicos
ANÔNIMOAsgard | God Of War Amino™ Amino
    Os deuses nórdicos estavam com problemas no alto reino de Asgard. A casa onde moravam não tinha muros para protegê-la dos inimigos. Assim, quando um cavaleiro passou e ofereceu para construir um muro, eles escutaram com atenção."Será um grande muro", ele disse, "uma barreira para todos os inimigos. De hoje a dezoito meses, todas as suas preocupações se acabarão". "E qual é seu preço?", perguntou Odin, o sábio. "Nada menos que a deusa Freyja como esposa", respondeu o estrangeiro. "E o sol e a lua também".
     Os deuses ficaram furiosos e quiseram expulsar de Asgard o homem que tinha ousado pensar que a bela Freyja poderia ser negociada Mas o esperto Loki disse: "Se você puder construir o muro em seis meses, o negócio está fechado!. Aos outros deuses, sussurrou: "Em seis meses, ele só construirá meio muro, mas pelo menos essa parte será de graça." O homem olhou Freyja mais uma vez, enquanto ela chorava lágrimas de ouro, e concordou, se seu cavalo pudesse ajudá-lo.
     Durante todo o inverno o estrangeiro trabalhou. Com ajuda de seu cavalo, ele conseguiu juntar pedras para um muro maciço em volta de Asgard. Quando o verão se aproximou, o desastre esperava pelos deuses. Pois, contra todos os prognósticos, o construtor tinha quase terminado o muro. 
    "Você se julga tão esperto, Loki", disse Odin. "Você nos meteu nisso; agora você tem que nos tirar disso. Não podemos deixar Freyja se casar com este estrangeiro, que pode ser um gigante disfarçado. E, sem o sol e a lua, a vida não valerá a pena. Faça alguma coisa!"
   Loki pensou muito e disse: "Sem o cavalo o constru- tor não poderá trazer as pedras que faltam." Como Loki era capaz de se transformar, naquela noite ele se disfarçou em uma bela égua e atraiu para longe o cavalo do estrangeiro. Vendo que não poderia terminar o muro no prazo, o construtor ficou furioso. Seu disfarce caiu, revelando que ele era um gigante, um dos inimigos dos deuses. Os deuses chamaram Thor, o mais forte deles. Com seu martelo, Miollnir, Thor pagou ao construtor seu salário: não com o sol nem com a lua, mas com um tremendo golpe na cabeça. Quanto a Loki, quando achou que seria seguro voltar a Asgard, ele chegou com um cavalo de oito patas, cujo nome era Sleipnir. Loki deu Sleipnir para Odin, dizendo: "Nenhum cavalo jamais poderá competir com este. Ele o levará através dos mares e do ar, e para a terra dos mortos e de lá de volta." Como Loki prometeu, Sleipnir nunca falhou com seu novo senhor, Odin.
    Mas nem todos os descendentes de Loki são como Sleipnir. Loki é meio gigante e tem três filhos com uma giganta. O primeiro é Fenris-lobo, que no fim do mundo irá devorar Odin. O segundo é a serpente Midgard, e a terceira é a senhora da morte, Hel, que festeja com a fome e se alegra com a doença.
    Quando Odin viu que essas terríveis crianças estavam soltas no mundo, fez com que viessem até ele. A serpente ele jogou no oceano; ela era tão grande que circundou o mundo e mordeu seu próprio rabo. Hel, ele expulsou para Niflheim, a Terra dos Mortos, e lhe deu poder sobre tudo que morre de doença ou de velhice.
    Mas o Fenris-lobo não era fácil de controlar. Só o deus Tyr era suficientemente corajoso para alimentá-lo, e até ele podia ver que o Fenris-lobo logo ficaria forte o bastante, para fazer muito mal. Assim, os deuses fizeram uma corrente muito forte e o prenderam com ela. Mas com uma patada ele partiu a corrente. Eles tentaram outra vez com uma corrente ainda mais forte. E outra vez o lobo se soltou. Odin pediu ajuda aos anões, e eles fizeram o grilhão chamado Gleipnir. Macio como seda, Gleipnir era feito de ingredientes especiais: o som de um passo de gato; uma barba de mulher; as raízes de uma montanha; os tendões de um urso; a respiração de um peixe; e o cuspe de um pássaro.
    Os deuses levaram o Fenris-lobo para uma ilha deserta e o desafiaram a quebrar Gleipnir. Percebendo a armadilha, o lobo concordou em ser amarrado só se um dos deuses pusesse uma mão em sua boca, como sinal de boa fé. Assim, o bravo Tyr enfiou sua mão entre as mandíbulas do terrível lobo.
    Eles amarraram o lobo com os grilhões macios mas, dessa vez, quando ele esperneou o grilhão apenas se apertou mais. Furioso, o Fenris-lobo fechou suas enormes mandíbulas e decepou a mão direita do deus Tyr.
    Mesmo sabendo que chegaria o tempo em que o Fenris-lobo se libertaria e traria morte e destruição a todos eles, os deuses não o mataram.
"O  que  tem  de ser, será", disseram.

Fonte: As melhores Histórias da Mitologia Nórdica - 350Pg
segunda-feira, 13 de dezembro de 20101. Asgard - Mitologia Nórdica - Mitologia

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

ANÔNIMO - TELEMARKETING - O TROCO NA COMPANHIA TELEFÔNICA - CRONICAS ENGRAÇADAS - ANÔNIMO

Telemarketing - O Troco na Companhia Telefônica - Cronicas Engraçadas e Textos Engraçados
 ANÔNIMO

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Toca o telefone...
- Alô.
- Alô, poderia falar com o responsável pela linha? Disse a operadora de telemerketig
- Pois não, pode ser comigo mesmo.
- Quem fala, por favor? Perguntou a operadora.
- Paulo Roberto.
- Sr. Paulo, aqui é da Telefônica, estamos ligando para oferecer a promoção Telefônica linha adicional, onde o Sr. tem direito...
- Desculpe interromper, mas quem está falando?
- Aqui é Ivete, da Telefônica, e estamos ligando...
- Ivete minha filha! Desculpe-me, mas para nossa segurança, gostaria de conferir alguns dados antes de continuar a conversa, pode ser?
-... Bem, pode. Respondeu a resignada operadora de telemarketing.
- De que telefone você fala? Meu telefone não identificou você na lista.
- 103
- Você trabalha em que área, na Telefônica?
- Atendimento, Telemarketing Pró Ativo.
- Você tem número de matrícula na Telefônica?
- Senhor, desculpe, mas creio que essa informação não seja importante. Respondeu ela.
- Então terei que desligar, pois não posso ter segurança que falo com uma funcionária da Telefônica.
- Mas posso garantir...
- Além do mais, sempre sou obrigado a fornecer meus dados a uma relação enorme de atendentes sempre que tento falar com a Telefônica.
- Ok. Minha matrícula é 34591212. Respondeu.
- Só um momento enquanto verifico...
(Dois minutos)
- Só mais um momento...
(Cinco minutos), já vi esse filme antes.
- Senhoooor?
- Só mais um momento, por favor, nossos sistemas estão lentos hoje.
- Mas senhoooor...
- Pronto, Ivete, obrigado por ter aguardado. Qual o assunto?
- Aqui é da Telefônica, estamos ligando para oferecer a promoção linha adicional, onde o Senhor tem direito a uma linha adicional e o aparelho telefônico é gratuito. O senhor está interessado, Sr. Paulo?
- Ivete! Vou ter que transferir você para a minha mulher, porque é ela quem decide sobre alteração e aquisição de novos planos de telefones.  Por favor, não desligue, pois a sua ligação é muito importante para nós. (coloco o telefone em frente ao aparelho de som, deixo rolar a música Festa no Apê do Latino tocando durante alguns minutos (eu sabia que um dia desses esse sucesso iria servir para alguma coisa!), depois de tocar a música inteira, minha mulher atende:
- Obrigado por ter aguardado... Pode me dizer seu telefone, pois meu detector linear de ligações não identificou o seu..
- 103
- Com quem estou falando, por favor.
- Ivete! Responde a operadora de telemarketing.
- Ivete de quê?
Resultado de imagem para TELEFONISTA ESTRESSADA- Ivete Mariaaaa! (já demonstrando certa irritação na voz)
- Qual sua identificação na empresa
- 34591212 (mais irritada ainda! )
- Obrigada pelas suas informações, em que posso ajudá-la?
- Aqui é da Telefônica, estamos ligando para oferecer a promoção linha adicional, onde a Senhora tem direito a uma linha adicional e ainda ganha o aparelho telefônico de graça. A senhora está interessada? - disse a operadora de telemarketing.
- Vou abrir um chamado e em alguns dias entraremos em contato para dar uma resposta, pode anotar o protocolo, por favor... Alô, alô!
- Tu!Tu!Tu!Tu!Tu!Tu!
- Desligou... Nossa que moça estressada! Nem falou o preço do serviço.

EDILSON RODRIGUES SILVA - CARNAVAL, SAMBÓDRAMA E ALEGRIA - CRÔNICAS ENGRAÇADAS E DIVERTIDAS - HISTÓRIAS ENGRAÇADAS

Carnaval, Sambódrama e Alegria - Crônicas engraçadas e divertidas - Histórias Engraçadas
Edilson Rodrigues Silva
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Até que enfim o carnaval estava chegando. Naquele ano o pessoal da escola de samba estava cheio de nove horas e era mistério para tudo quanto era lado. Tudo por causa da espionagem das outras escolas. O carnavalesco ficou esperto, porque no ano passado tinham vazado algumas informações sobre as fantasias da escola e por isso este ano ele estava cheio de segredos.
Bem, independente de tudo, ela tinha uma certeza: Ela ia arrasar! Seria uma fantasia bem bonita e com um bom lugar de destaque na escola e na avenida. Precavida, foi se cuidar, malhar, perder uns quilinhos para fazer bonito na avenida, não queria ver nenhuma gordurinha a mais.
Era um sonho! Para ela sair na avenida era a glória. Tudo era maravilhoso: As luzes, as serpentinas, os confetes, o povão na arquibancada aclamando a escola com alegria e muita emoção. 
No ano passado já tinha sido muito legal. O diretor de fantasia prometeu para a garota que no próximo ano ela ia ter uma participação muito especial. A guria estava toda feliz e já contava que receberia a fantasia mais bacana de toda a sua vida, uma fantasia digna da sua dedicação à comunidade e ao pavilhão. Certamente ia ser uma fantasia e uma participação muito especial. 
Sendo assim, ela ficou cheia de ansiedade esperando o dia de colocar as mãos na tão falada fantasia. Chegou até a sonhar com a dita cuja. Foram meses de espera até que um dia o diretor mandou chamá-la para conhecer e experimentar a tão sonhada fantasia.
Lá foi ela. Será que ela ia sair nos carros da frente ou nos carros de trás? Bem, isso na verdade não tinha tanta importância assim. O que importava mesmo era que ela estava crescendo na escola e dentro de pouco tempo ela ia ser um dos grandes destaques da escola do coração. Pensava ela.
- Oi meu anjo! Tudo bem contigo? Disse o diretor, todo cheio de charme. Espere um pouquinho que eu já volto. 
Minutos depois ele voltou com a tão esperada fantasia: 
- Aqui está minha querida! A sua fantasia, espero que você goste? Você vai sair na principal ala do desfile deste ano. Nós vamos arrasar! Contamos com o seu empenho e com a sua dedicação.
- O que é isso diretor? Isso é a minha fantasia? Mas que diacho de coisa é essa? Disse ela, completamente espantada com a fantasia.
- Você não entendeu a sua fantasia? Não gostou? estranhou o diretor.
- Não! Não entendi. Que treco é esse? Respondeu a decepcionada garota.
- O que é isso? Ora! É um torresmo! Disse o diretor.
- O quêêê! Um torresmo? Você está de brincadeira comigo não é? Reclamou a garota.
- Ora, minha querida, você deveria estar feliz. Você vai sair na ala da feijoada, o principal prato da cozinha brasileira. Você não esqueceu que neste ano nós vamos fazer uma homenagem à nossa maravilhosa culinária?
Ela foi embora pensando: Belo destaque que eu sou. Quero ver eu me destacar na avenida saindo fantasiada de pururuca. Quero só ver!

...

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domingo, 15 de fevereiro de 2015

ADAPTAÇÃO DE ANTÓNIO MOTA - O GRILO VERDE

O GRILO VERDE

Adaptação
António Mota
O grilo verde
Porto, Ambar, 1999

Resultado de imagem para O GRILO VERDE.giftCerto dia, apareceu na horta do Tio Manuel Liró um grilo espantoso. Era verde, tão verde como as alfaces repolhudas que cresciam num pequeno canteiro ao cimo da horta. E em dias de sol e noites estreladas, punha-se a assobiar modinhas.
Os grilos que viviam por perto, como não eram verdes nem sabiam assobiar, acharam aquele vizinho esquisito, muito invulgar. Foram contar aos colegas que moravam por aquelas redondezas.
— VERDE?!
— E ASSOBIA?!… PODE LÁ SER!
A notícia espalhou-se, andou de toca em toca, voou de lura em lura. Todos os grilos ficaram a saber das afrontas do parceiro que morava na horta do Tio Manuel Liró. Sim, afrontas! Ser-se verde e assobiador não eram coisas de grilo que se fizessem… Resolveram fazer-lhe uma visita para o convencer a mudar de farda e de música.
Numa tarde de domingo deixaram as luras que tinham nos quintais, campos, bouças e matas. Entraram na horta do Tio Manuel Liró e perguntaram ao companheiro:
— Porque não tens uma cor igual à nossa? Porque não cricrilas?
Então o Grilo Verde respondeu-lhes:
— Se nasci verde, não posso ser preto. E se assobio é porque não sei fazer outra coisa. E vós — perguntou — porque não sois verdes e não sabeis assobiar como eu?
— Porque sempre fomos pretos e só sabemos cricrilar.
— Então — concluiu o Grilo Verde — estamos empatados: se eu sou verde — vós sois pretos; se assobio — vós cricrilais. Para quê tanta preocupação?
— Alto lá! — reagiram os grilos pretos — Esqueces-te que és o primeiro colega a fazer tamanhos disparates!
— E não será disparate ter cor preta e cricrilar?
— Não venhas com bazófia. Por acaso já pensaste na confusão que vais criar?
— Confusão!? — espantou-se o Grilo Verde — Eu?!…
— Já pensaste que, se por acaso os homens te vêem, vão logo dizer aos seus amigos que há grilos que não são pretos e grilos que assobiam. Já pensaste nisso? E por tua causa todos os grilos do Mundo ficam desacreditados!
— Não vejo mal nisso… Mas dizei-me — pediu o Grilo Verde — o que devo fazer?
— Deves mudar de cor e nunca mais, mas nunca, nunca mais assobiar, entendido?
O Grilo Verde ficou calado, pensativo.
— Ides desculpar — disse ele — mas não posso fazer o que me pedis.
— Pensa bem…
— Já pensei o que devia pensar, e volto a dizer que estais a pedir coisas impossíveis, coisas malucas. Cada um é como é…
— Então — decidiram os grilos pretos — somos obrigados a agir imediatamente para remediar o equívoco: vamos prender-te.
— Prender-me?
— Sim, caro colega. Serás metido na lura mais funda que conseguirmos fazer. Ninguém mais verá esse ridículo verde da tua pele, ninguém mais escutará essas estúpidas modinhas que assobias… Descansa, fome não passarás, haverá sempre à tua disposição alface e senradela com fartura.
O Grilo Verde olhou à sua volta e ficou desesperado: eram tantos os grilos pretos a rodeá-lo… como poderia escapar?
— Não vos passou pela cabeça — disse o Grilo Verde — que ides fazer uma coisa estúpida, praticar uma grande injustiça? Que mal vos fiz? Governo a minha vida como qualquer grilo e dou umas assobiadelas. Onde está o mal, dizei-me?!
— Ó coleguinha! Estás a esquecer um assunto demasiado importante para todos nós: A NOSSA REPUTAÇÃO!
— RE-PU-TA-ÇÃO? O que é isso?!… — admirou-se o Grilo Verde.
— É o nome, a fama, a tradição, a reputação! Os grilos sempre foram pretos e nunca deixaram de cricrilar!
— E o nome, a fama, a tradição e a reputação dos grilos também diz que se deve prender os que não são pretos nem sabem cricrilar? — perguntou o Grilo Verde.
— Não venhas com conversa fiada, nem tentes baralhar-nos as ideias. Prepara-te para partires connosco.
Os grilos pretos começaram a fazer um cerco cada vez mais apertado ao colega vestido de verde — e este, quando se viu muito entrasgado, desatou aos saltos, tentando fugir.
— Agarra que é verde! Apanha o assobiador! Cri-cri-cri-cri — E os grilos pretos saltavam, pulavam, caíam. O Grilo Verde, esse fugia para um lado, fintava um colega, saía para o lado contrário, dava um salto e fintava outro.
— Ai a minha vida! Ai que lá vou para a toca funda — mas o Grilo Verde fugia sempre, sempre — cada vez mais aflito, mais cercado, mais cansado…
E se o Tio Manuel Liró não entrasse na horta a tempo de escorraçar os grilos pretos, certamente o Grilo Verde seria apanhado pelos colegas e de seguida metido numa lura funda.
Eu conto como tudo se passou.
Nas tardes de sol, o Tio Manuel Liró costumava ir sentar-se sob a sombra de uma oliveira ramalhuda que havia ao fundo da horta, para ler o jornal, e por fim dormir uma pacífica soneca! Ora, nessa tarde de domingo, o Tio Manuel Liró entrou na horta e, como de costume, foi sentar-se à sombra da oliveira, ignorando que havia visitantes por perto. Abriu o jornal, leu as palavras de letras gordas com muita atenção. Depois virou a página e começou a ler as letras mais pequenas. Mas essas letras, como eram pequenas, gostavam de brincar: punham-se a dar saltinhos de um lado para o outro, pulavam para cima e para baixo, faziam danças de roda… E os olhos do Tio Manuel, que já estavam um pouco cansados, não acharam piada nenhuma àquelas letras brincalhonas — fecharam-se. O sono, que rondava por perto, aproveitou a ocasião e, rápido, enfiou-se no corpo do Tio Manuel Liró.
Mas foi por pouco tempo. Era grande, muito grande a barulheira que os grilos faziam. E o sono, que detesta barulho, fugiu em grande velocidade.
O Tio Manuel Liró acordou estremunhado.
— Raio de grilos! Que barulho, santo Deus!… Calai-vos, desafinados duma cana!
Todavia, os grilos continuavam a fazer grande algazarra, indiferentes à zanga do dono da horta.
— Calai-vos! — gritou o Tio Manuel Liró. E a barulheira continuava…
— Ai sim! Então esperai pelas alfaces… esperai.
Zangado, estremunhado, o Tio Manuel Liró levantou-se, atirou o jornal ao chão e, correndo, atravessou a horta.
Voltou daí a momentos com uma grande enxada nas mãos. Sem fazer barulho começou a percorrer a horta, talho por talho, tentando localizar os importunadores barulhentos.
E tanto andou, tanto rebuscou, que conseguiu descobrir o paradeiro deles. Mas, ó grande azar, ó pouca sorte! Onde é que os grilos haviam de estar metidos? — No meio do feijoal, no talho dos seus viçosos feijoeiros…
«E agora, Manuel? — pôs-se o velho Manuel Liró a pensar.
— Desfaço ou não desfaço? Se desfaço o feijoal e espanto os grilos para longe daqui, passo a dormir descansado. Mas, se não desfaço os feijoeiros e não espanto os grilos, jamais dormirei uma soneca em paz. E agora, o que faço?».
O Tio Manuel pensou, matutou, ponderou e finalmente decidiu:
— Guerra aos grilos! Nem mais um cri-cri na minha horta! Quero dormir descansado. Fora! Fora daqui, seus casacas! — E, pegando na enxada, pôs-se o Tio Manuel a cavar o talho, a arrancar os feijoeiros, a cortar as vagens, a desfazer os feijões…
Os grilos pretos mal viram aquele pedaço de ferro afiado a arrasar tudo, tiveram medo, esqueceram-se de dar caça ao colega verde e tentaram escapar-se, fugindo ligeirinhos, mais lestos que saltaricos.
E o Grilo Verde? Esse, empoleirou-se numa couve, e dando um suspiro de alívio, escondeu-se entre as suas folhas verdes, tenras e largas, deixando-se estar quieto, caladinho.
E o Tio Manuel Liró continuou a cavar o talho, mexendo-o de ponta a ponta. Grilos não viu. E voltou a cavar, cada vez mais furioso. Cavou, cavou, estrangalhou, revirou a terra e voltou a revirar… Mas como podiam aparecer grilos se já tinham dado à pata?!
Transpirado, corado, aborrecido, enervado, fatigado, o Tio Manuel Liró pensou: «Foram-se os grilos e foi-se o feijoal».
Exausto, voltou para a sombra da oliveira. Pegou no jornal, leu novamente as palavras de letras gordas, virou a folha, suspirou três vezes, esqueceu o incidente, fechou os olhos e adormeceu.
E foi então que se deu um caso extraordinário, só estando lá para ver e pasmar:
Enquanto o Tio Manuel dormia a sua soneca, cresceram umas grandes asas cor de fogo no corpo do Grilo Verde. E este, saindo da couve onde estava empoleirado, começou a voar à roda da horta, por cima dos talhos. Depois subiu e foi poisar no ramo mais alto da oliveira, enquanto assobiava uma bela e estranha melodia.
O Tio Manuel acordou de mansinho ao som da música.
«Mas que belíssima melodia! Onde está o seu executante?», pôs-se o dono da horta a pensar, enquanto olhava para todos os lados, atento, admirado.
A música vinha de cima, dos ramos da oliveira, mas não se via nada!
— Quem assobia tão bem que faça o favor de descer e de se mostrar para que eu o felicite — pediu o Tio Manuel Liró.
Então o Grilo Verde desceu da oliveira, voando com as suas asas cor de fogo, e mostrou-se ao dono da horta.
Resultado de imagem para GAFANHOTO COM ASAS DE FOGO— Que bicho tão estranho tu és! Pareces uma borboleta, mas assobias maravilhosamente… Também és parecido com um grilo… mas és verde! És tão estranho!… Espera aí! — E o Tio Manuel pensou apanhar o Grilo Verde e levá-lo consigo para mostrar aos amigos. Mas, quando estendeu os braços e abriu as mãos para o apanhar, o Grilo Verde escapou-se e de imediato começou a subir no céu azul.
Foi subindo, subindo e assobiando aquela bela e estranha melodia, até que, e para espanto do Tio Manuel Liró, o Grilo Verde desapareceu entre um castelo de nuvens, voando, voando com as suas asas cor de fogo.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

ANÔNIMO - O CÃO PRETO (CONTO INDIANO)

O CÃO PRETO
ANÔNIMO
(conto indiano)
Margaret Read MacDonald
Peace Tales
Arkansas, August House Publishers, Inc., 2005

Shakra, rei dos deuses, ergueu-se do seu trono dourado e observou a Terra com atenção. Havia oceanos reluzentes e nuvens como pérolas, montanhas com cumes de neve e continentes de muitas cores. Embora tudo fosse belo, Shakra sentiu uma certa apreensão.
Os seus sentidos luminosos expandiram-se pelos céus. Sentiu o calor da guerra. Ouviu o balir dos vitelos, o ladrar dos cães, o grasnar dos corvos. Ouviu crianças a chorarem e vozes a gritarem de raiva. Ouviu o choro dos esfomeados, dos sós, dos pobres. As lágrimas rolaram-lhe pela cara abaixo e caíram sobre a terra como aguaceiros de meteoros.
— É preciso fazer alguma coisa! — disse Shakra.
Metamorfoseou-se num guarda-florestal e levou consigo um grande arco em osso. A seu lado caminhava um grande cão preto. O pelo do cão era emaranhado, os olhos brilhavam como fogo incandescente, os dentes mais pareciam presas, e a boca e língua pendente eram da cor do sangue.
Shakra e o cão deram um salto e mergulharam em direcção à Terra por entre as estrelas brilhantes. Por fim, aterraram mesmo ao lado de uma cidade esplêndida.
— Quem és tu, forasteiro? — perguntou, admirado, um soldado, do alto das muralhas da cidade.
— Sou estrangeiro nestas paragens e este — disse, apontando o animal com um gesto — é o meu cão.
O cão preto abriu as mandíbulas. O soldado que estava de guarda às muralhas ficou aterrado. Foi como se estivesse a olhar para um enorme caldeirão de fogo e de sangue. A garganta do cão emanava fumo. As mandíbulas do cão abriram-se ainda mais e mais…
— Fechem os portões! — ordenou o soldado. — Fechem-nos imediatamente!
Mas Shakra e o cão conseguiram saltar os portões cerrados. Os habitantes da cidade fugiram em todas as direcções, como se fossem marés a subir ao longo de uma praia. O cão foi no seu encalço, juntando as pessoas como se fossem um rebanho de ovelhas. Homens, mulheres e crianças gritavam, aterrorizados.
— Parem! — gritou Shakra. — Não se mexam!
As pessoas imobilizaram-se.
— O meu cão tem fome. O meu cão tem de ser alimentado.
O rei da cidade, a tremer de medo, ordenou:
— Rápido! Tragam comida para o cão! Imediatamente!
Em breve, carroças chegavam ao mercado carregadas de carne, pão, milho, frutos e cereais. O cão engoliu tudo de uma só vez.
— O meu cão precisa de mais comida! — exclamou Shakra.
Resultado de imagem para corroças com colheita.giftAs carroças voltaram de novo, carregadas. E o cão voltou a devorar tudo de uma assentada. Depois soltou um grito de angústia, um grito que parecia emanar das profundezas do Inferno.
As pessoas caíram por terra e taparam os ouvidos, aterradas. Shakra, o forasteiro, fez soar a corda do seu arco, que fez um ruído semelhante ao ribombar do trovão numa noite de tempestade.
Resultado de imagem para raio e trovão.gift— O meu cão ainda tem fome! — Dêem-lhe de comer!
O rei contorceu as mãos e pôs--se a chorar.
— Já lhe demos tudo o que tínhamos. Não temos mais!
— Sendo assim, o meu cão alimentar-se-á de pastos e montanhas, de pássaros e animais ferozes. Devorará as rochas e mastigará o sol e a lua. O meu cão alimentar-se-á de vós!
— Não! — gritaram as pessoas. — Tem misericórdia de nós! Rogamos-te que nos poupes! Poupa o nosso mundo!
— Então acabem com a guerra — disse Shakra. Alimentem os pobres. Cuidem dos doentes, dos sem-abrigo, dos órfãos, dos velhos. Ensinem a bondade e a coragem às vossas crianças. Respeitem a terra e todas as suas criaturas. Só assim açaimarei o meu cão.
Resultado de imagem para gigante de fogo.giftShakra transformou-se num gigante, resplandecente de luz. Ele e o cão deram um salto e, numa espiral de fumo, subiram cada vez mais alto.
Lá em baixo, nas ruas da cidade, homens e mulheres olhavam o céu consternados. Estenderam as mãos uns para os outros e prometeram mudar as suas vidas, fazer o que o forasteiro lhes tinha ordenado que fizessem.

Bem lá de cima, Shakra sorriu no seu trono dourado, ao olhar para a terra. Limpou a testa com um braço resplandecente.  As inúmeras estrelas cintilavam, fulgentes, e a escuridão dormitava entre elas, tal como um cão junto de uma fogueira.