Get me outta here!

terça-feira, 26 de setembro de 2017

MISSE , JAMES - O TERCEIRO OUVIDO

"O TERCEIRO OUVIDO"

AUTOR: JAMES MISSE

Às vezes fico pensando,
Como seria bom se papai
Me ouvisse de verdade.
Que pudesse olhar para mim
Com atenção e sinceridade.
Às vezes faço perguntas, mas não
É bem aquilo que quero dizer.
Talvez fosse legal se papai
Tivesse um terceiro ouvido,
Para melhor me compreender.
Então, quando eu falar:
- Olha que machucadão!
Ele ouviria com o terceiro ouvido:
- O que mais quero é sua atenção.
- Olha o que eu fiz!
Ele ouviria com o terceiro ouvido:
- Se me elogiar com sinceridade,
Me sentirei feliz!
- Você me dá um presente diferente?
Ele ouviria com o terceiro ouvido:
- Papai, quero brincar com você
Uma hora por dia.
Isso me deixaria contente!
- Papai, você vai
sair de novo?
Ele ouviria com o
terceiro ouvido:
- Papai, quero ficar
com você!


domingo, 24 de setembro de 2017

RUTH ROCHA - UMA HISTÓRIA COM MIL MACACOS

Uma história com mil macacos

Ruth Rocha

Lá na minha terra morava um grande cientista: o
Doutor Eduardo Quaresma. Ele estava estudando a personalidade de diversos animais. Para isso, ele precisava observar os animais.
Então um dia o Doutor precisou arranjar alguns macacos, para observar o comportamento deles. Na minha cidade não tem Jardim Zoológico. E mesmo que tivesse, eu acho que os zoológicos não andam emprestando bichos sem mais nem menos.
Por isso, o Dr. Quaresma mandou um telegrama para o amigo dele, lá na Amazônia. Um tal de Jeremias não sei do quê. O telegrama era assim:
“PRECISO DE MACACOS PARA MEUS ESTUDOS. MANDE 1
OU 2 MACACOS. ABRAÇOS.

QUERESMA”
O Zeca é o nosso telegrafista. Ele é meio desligado, distraído... Mas mandou o telegrama e o Doutor Quaresma ficou esperando o resultado. Um dia chegou pelo trem das duas uma porção de caixas endereçadas ao Doutor. O Doutor ficou espantado, porque nas caixas vinham uns 10 ou 12 macacos.
- Ora essa, que exagero do Jeremias! - Pensou o Doutor.
Mas também ficou satisfeito porque podia começar seus estudos. Acomodou os macacos como pôde no quintal, onde havia muitas árvores, para espanto das galinhas do galinheiro.
No dia seguinte, pelo trem das duas, chegou mais um carregamento para o Doutor com mais 10 ou 12 macacos. Quando a encomenda chegou, o Doutor apavorou:
- SERÁ QUE JEREMIAS FICOU MALUCO?
Mas guardou os macacos e prosseguiu nos seus estudos...
Só que no dia seguinte, no dia seguinte ao dia seguinte, e nos dias que se seguiram ao dia seguinte... Todos os dias, pontualmente, pelo trem das duas, chegava um novo carregamento de macacos. O Doutor começou a ficar desesperado!
- QUE SERÁ QUE DEU NO JEREMIAS?
E resolveu falar com o Zeca e verificar o telegrama que ele tinha mandado. E caiu das nuvens quando o Zeca mostrou o texto do telegrama a ele. É isso, seu Doutor, mandei o telegrama direitinho.
TELEGRAMA:
DESTINATÁRIO:
JEREMIAS DA SILVA PT
AMAZONIA PT
PRECISO MACACOS PARA MEUS ESTUDOS PT MANDE 1 0 2 MACACOS PT ABRAÇOS PT
REMETENTE: EDUARDO QUARESMA PT
Em vez de 1 ou 2, o Zeca escreveu: 1 0 2 macacos –
cento e dois macacos! O caso era grave! No quintal do doutor Quaresma já havia uma verdadeira macacada! Os meninos passaram pela casa do Doutor e apontavam: É ali que mora o doutor dos macacos!
O preço da banana, na cidade, ficou caríssimo, porque o Doutor comprava tudo que era banana para alimentar a macacada.
O Doutor resolveu passar outro telegrama urgente para Jeremias. Foi ao Correio falar com Zeca.
- Seu Zeca, preste bem atenção! Vamos mandar um
telegrama ao meu amigo dos macacos. Escreva aí: “PARE DE MANDAR MACACOS”. Mas o Zeca era teimoso e disse:
- Não é melhor explicar bem? Que a cidade é pequena, a macacada é grande...
- Não, não! – o Doutor insistiu.
- Escreva como eu disse: “PARE DE MANDAR MACACOS”.
- Mas, Seu Quaresma, não é melhor explicar direitinho, que é para entender.
- NÃO! PARE DE MANDAR MACACOS! Fica muito bem explicado.
O Zeca tomou nota e enviou o telegrama:
“NÃO PARE DE MANDAR MACACOS”.
Ai é que os macacos não paravam de chegar nunca
mais... Todos os dias, pelo trem das duas, chegava um novo carregamento. O Doutor já tinha tentado soltar alguns no mato, mas eles voltavam para a cidade e faziam as maiores loucuras. Já tinha dado macaco a tudo que era amigo, mas as mulheres dos amigos nem falavam mais com ele. E o Doutor voltou mais uma vez ao correio para falar com o Zeca e pediu para ler o texto do telegrama que era assim:
TELEGRAMA:
DESTINATÁRIO:
JEREMIAS DA SILVA PT
AMAZONIA PT
 “NÃO PARE DE MANDAR MACACOS”.
PT ABRAÇOS PT
REMETENTE: EDUARDO QUARESMA PT
E eu nem vou contar a vocês o que o Doutor disse pro Zeca...
No dia seguinte, quando o trem das duas chegou com mais um carregamento de macacos...
Enquanto os empregados estavam na estação e
tiravam os macacos por um lado do trem, o Doutor Quaresma embarcava pelo outro, nunca mais ninguém da minha cidade ouviu falar do Doutor.
E os macacos? Bem, quando o Doutor fugiu da cidade, deixou uma carta, com cópia para todo mundo. A carta dizia assim:
 “EU VOU EMBORA DESTA CIDADE, MAS DEIXO TODOS OS MEUS BENS PARA O MEU QUERIDO AMIGO ZECA TELEGRAFISTA. EDUARDO QUARESMA”

       E assim o Zeca recebeu de presente os bens do Doutor: a macacada toda. E até hoje o Zeca é babá de macaco.

SAM MCBRATNEY - ADIVINHA QUANTO EU TE AMO

ADIVINHA QUANTO EU TE AMO
SAM MCBRATNEY

"Era hora de ir para a cama, e o Coelhinho se
agarrou firme nas longas orelhas do Coelho Pai.
Ele queria ter certeza de que o Coelho Pai estava ouvindo.
- Adivinha quanto eu te amo? - disse ele.
- Ah, acho que isso eu não consigo adivinhar - respondeu o Coelho Pai.
- Tudo isso - disse o Coelhinho, esticando seus bracinhos o máximo que podia.
Só que o Coelho Pai tinha os braços mais compridos. E disse:
- E eu te amo tudo isto !
- Huuum,isso é um bocado, pensou o Coelhinho.
- Eu te amo toda a minha altura - disse o Coelhinho.
- E eu te amo toda minha altura - disse o Coelho Pai.
Puxa, isso é bem alto, pensou o Coelhinho. Eu queria ter os braços compridos assim.
Então o Coelhinho teve uma boa ideia. Ele se virou
de ponta cabeça, apoiando as patinhas na árvore.
- Eu te amo até as pontas dos dedos de meus pés!
- E eu te amo até as pontas dos dedos dos teus pés - disse o Coelho Pai balançando o filho no ar.
- Eu te amo a altura de meu pulo! - riu o Coelhinho saltando, para lá e para cá.
- E eu te amo a altura do meu pulo - riu também o Coelho Pai e saltou tão alto que suas orelhas tocaram os galhos das árvores.
- Eu te amo toda a estradinha daqui até o rio - gritou o Coelhinho.
- Eu te amo até depois do rio até as colinas - disse o Coelho Pai.
É uma bela distância,pensou o Coelhinho.
Ele estava sonolento demais para continuar pensando.
Então ele olhou para além das copas das árvores,
para a imensa escuridão da noite.
Nada podia ser maior do que o Céu.
- Eu te amo ATÉ A LUA! - disse ele, e fechou os olhos.
- Puxa, isso é longe disse o Coelho Pai. Longe mesmo!
O Coelho Pai deitou o Coelhinho na sua caminha de folhas. E então se inclinou para lhe dar um beijo de Boa Noite.
Depois, deitou-se ao lado do filho e sussurrou sorrindo:
- Eu te amo até a lua...IDA E VOLTA !"



FIM

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

RAQUEL DE QUEIRÓS - O RÁDIO

O RÁDIO 
Raquel de Queirós

 Resultado de imagem para o rádio a pilhaSei que o homem desembarcar na Lua foi o fato mais importante do século – e quem sabe até da história do mundo. Mas a divulgação do rádio transistor teve um alcance muito maior, em sentido imediato.
Não conheço outra criação do progresso que possuísse tal capacidade de penetração nem fosse tão rapidamente aceita pelas populações mais atrasadas. Máquina de costura, luz elétrica, agulha de injeção, tudo isso espalhou-se depressa e profundamente – mas não chega aos pés do rádio de pilha. Até do motor a explosão, o rádio ganha, por causa da sua acessibilidade. Todo o mundo pode sonhar com um carro, até índio – mas adquiri-lo já é outra coisa. Enquanto o rádio está praticamente ao alcance de todos – até do índio, também.
Resultado de imagem para o rádio a pilhaNo sertão mais escondido, em barrancas secretas de rio por Amazonas e Goiás, em serranias perdidas, em campinas longe do mundo, se a gente avista uma casa de caboclo, de colono, de pioneiro emigrante, nove casos em cada dez, verá, por cima do telhado rústico, de cumeeira a cumeeira, o fio de cobre da antena do rádio. Dentro da casa haverá um tamborete, um pote, um fogão de barro, nada mais. Porém em cima de um caixote improvisado em mesa, trepado num caritó na parede da sala, quase infalivelmente você verá um rádio. Tocando o dia inteiro as suas musiquinhas de dois vinténs (e por isso matando a velha e preciosa música folclórica), espalhando notícias e – essa, sim, é a sua contribuição mais importante – servindo de elo de ligação entre populações distantes que não têm entre si outro veículo de comunicação, dando recados, pedindo notícias, acusando cartas, servindo de correio gracioso aos que não têm outro correio ou, tendo-o, não sabem como usá-lo.
Rara é a estação de interior – rara não, acho que não há mesmo nenhuma que deixe de ter a sua "hora sertaneja" ou "alô, sertão", ou "mande o seu recado", ou outro programa equivalente. E comove a gente ouvir o trançado das informações e avisos – "Dona Maria de Tal, fazenda Carnaúba, sua filha mandou dizer que o menino operou-se e vai se salvar". "Seu Raimundinho Nonato, do sítio Pacavira, avisa à família que perdeu o trem ontem e agora só pode ir na semana que vem." "Rosélia do Putuí, Baturité, avisa aos irmãos Ribamar e Vicente, na Barra do Ceará, que a mãe faleceu repentinamente, o enterro é hoje mesmo."
Resultado de imagem para o rádio a pilhaA princípio se estranha como é que chegam a destino aquelas comunicações perdidas, sem horário certo. Depois se entende – os rádios estão sempre ligados, sempre tem em casa uma pessoa que escuta os recados. Ao ouvir um nome conhecido, arrebita a orelha, presta a atenção e passa adiante o recado a quem interessa. É raríssimo perder-se um comunicado ou chegar ele com atraso. Sempre alguém por perto escutou.






Resultado de imagem para o rádio a pilhaE pode faltar na casa o dinheiro para o fumo ou o café, para a rede nova, para o corte de pano da mulher, mas não faltará para o carrego do rádio – ou seja, carga de pilhas do aparelho. E também, sendo o rádio objeto de tão indispensável presença em todos os lares, e sendo quase sempre escasso o dinheiro em moeda corrente, os rádios são negociados nas barganhas mais singulares: um rádio novo por dois bacorinhos, um saco de milho e meia arroba de algodão; um rádio velho, já passado por muitas mãos, por um amarrado de frangos e um relógio de pulso com corda quebrada; um rádio ainda mais ou menos por tantos dias de serviço, uma lanterna de pilha, sem carrego e uma ninhada de ovos de galinha indiana... Qualquer negócio vale, contanto que o rádio venha; pois é da nossa natureza, mesmo entre os mais esquecidos e abandonados dos seres, esse desejo e esse orgulho de pertencer – (nem que seja através de uma voz distante dentro de uma caixa de plástico) –, de fazer parte, de se integrar na comunhão dos homens.

© 2008 Fernando Morgado. Todos os direitos reservados
"O Rádio", de Rachel de Queiroz. Publicado na última página da edição de 22/5/1974 da revista <em>O Cruzeiro. O texto revela a visão pessoal dessa grande escritora sobre o impacto do rádio na vida das pessoas, principalmente no interior do Brasil.


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