O DOMADOR DE ELEFANTES
MALBA TAHAN
Na décima quinta página do livro Yu-King poderás ler, ó Irmão dos
árabes¹, a singular aventura ocorrida na Índia com um domador de elefantes.
Vamos traduzi-la com a maior fidelidade,
seguindo, nas linhas e nas entrelinhas, o pensamento do velho sacerdote budista
que a escreveu.
No antigo paix² de Carvásti, para além do Ganges, o rá³ Lauit anunciou ao povo que precisava, com certa urgência, de um
domador de elefantes. Apresentou-se um homem chamado Sougraha, que se dizia
perito nesse perigoso ofício.
- Conheço, ó rei – declarou Sougraha – três, maneiras seguras por meio das quais será fácil domesticar um. elefante. A primeira é pelas argolas de prata...
- Está bem – acudiu secamente o monarca – Aceito
a tua oferta. Poderás amanhã, depois da prece, iniciar o teu trabalho. O
elefante bravio, de minha predileção, será trazido para o pátio. Terás, no fim,
uma boa recompensa.
Momentos depois, ao deixar o palácio, o
vaidoso Sougraha passou ao lado de um grupo de servos e um destes proferiu um
gracejo qualquer. Não se conteve o domador; avançou impetuoso, colérico, contra
o jovem e feriu-o gravemente.
Preso pelos guardas, foi o agressor
conduzido à presença do rei.
- Que foi isso, meu amigo? – interpelou,
muito sério, o monarca. – Que se passou, afinal?
- Senhor – respondeu Sougraha, com tremores
na voz. – Não poderei ocultar a verdade. Ao sair deste palácio, depois da
audiência, cruzei, na escada, com um grupo de servos. Um deles dirigiu-me uma
pilhéria. Não me contive. Avancei, de golpe, contra o gaiato e castiguei-o com
extrema violência. Foi tudo, confuso, obra irrefletida do impulso de um
momento.
Ponderou, então, o rei, serenamente, com
intencional frieza:
Como pretendes, ó Sougraha, domesticar um
elefante bravio, se não és capaz de conter a fera odienta que vive dentro de
ti? Aprende, primeiro, meu amigo, a dominar os teus impulsos, o teu gênio, a
tua cólera.
E, numa decisão irrevogável, concluiu:
- Retira-te! Não mais me interessa a tua
colaboração. Educa-te primeiro, para que possas, depois, educar.
¹Forma carinhosa com
que os árabes se dirigem aos seus companheiros.
²Pequeno
domínio
³
Senhor
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