O Pássaro e Eu
Contos
Indianos
Prof.
Paulo Murilo Rosas
Era
uma vez um pássaro tão belo que, ao perceber a sua beleza e grandeza
espiritual, quis mantê-lo junto a mim aprisionando-o numa gaiola.
Consegui
durante anos mantê-lo no cativeiro o qual procurei construir o mais bonito,
agradável e aconchegante possível. Dia após dia, ao mesmo tempo em que cuidava
dele e o protegia, também, sem perceber, cerceava seus movimentos,
restringindo-os àquele pequeno espaço que o cercava e não o deixava alçar vôos
mais altos. Era difícil para mim dividi-lo, deixar que abrisse suas asas e
voasse mais longe. Tinha receio de que não voltasse, tinha medo de perdê-lo;
mas, com essa atitude, não percebia que não só o prejudicava como também
impedia outras pessoas de ver a beleza e escutar o canto libertador desse
pequeno grande pássaro. Ele veio para anunciar a aurora de um novo dia, dar uma
nova mensagem com o seu canto diferente, bonito, mas ao mesmo tempo ameaçador;
porque ensinava a todos que a liberdade vinha através do conhecimento de quem
somos e este conhecimento independe de credo, raça ou cor.
Passei
anos escutando este canto, mas ainda assim não conseguia libertar o pássaro;
cada vez o queria mais junto a mim, mais próximo, como se nessa proximidade eu
me tornasse pássaro também. Algumas vezes abria a porta da gaiola e permitia
pequenos vôos, sempre restritos a ambientes fechados para que ele, ao exercitar
suas asas, tivesse a impressão de liberdade.
Um
belo dia, Nataraja, o Senhor da Dança, sem que eu percebesse, escutou o seu
canto e se enamorou. Viu que este canto libertador precisava ser ouvido por
mais pessoas e não poderia ficar confinado naquele pequeno espaço e, então,
iniciou a sua dança; e a cada passo que dava ia abrindo sulcos na terra e
destruindo as grades da gaiola. À medida que o pássaro iniciava seu vôo eu ia
caindo nos sulcos abertos na terra pelos pés de Nataraja, o que me impedia de
manter o pássaro aprisionado. Cada vez afundava mais e mais, parecia estar num
grande cânion sem fim e, por mais que eu me debatesse e tentasse segurar nas
bordas ou nas fendas da terra, afundava cada vez mais.
Em um
dado momento, percebi que quanto mais tentava me segurar, mais profundo me
parecia o cânion e mais dolorosa a queda e o sentimento de perda que ele
representava. Perdi literalmente o chão e não conseguia visualizar terra firme,
perdi as forças e deixei de lutar. Abandonei-me, a essa altura, às lembranças
dos sons do canto; comecei a ser envolvido pela beleza e a graça dos movimentos
da dança da criação e da destruição do Senhor Nataraja; à medida que me
abandonava àquele ritmo contagiante, as fendas foram pouco a pouco se fechando
e fui começando a escutar os sons do pássaro de uma maneira mais abrangente e,
na profundidade do meu Ser, já não chorava mais pela perda. Ao contrário,
sorria de alegria por poder, agora sim, compreender a liberdade que o canto do
pássaro me propiciava e dançar livremente ao som dele como fazia o Senhor da
Dança e do Conhecimento.
Hoje
em dia, o pássaro consegue levar o seu canto libertador por todos os rincões do
nosso país; mais pessoas têm acesso ao conhecimento, e eu, continuo dançando
como Nataraja, ao som dele, podendo vivenciá-lo em todos os momentos da minha
vida, pois agora, trago o pássaro e o seu canto no meu coração.
FIN
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